Thursday, May 24, 2007

O Sucesso é diferente da Fama

Antes: "Existe a beleza clássica, a beleza exótica, beleza meiga, beleza rude, beleza brejeira, beleza natural... Agora, se tu é feio, ou tu é feio de doer nas "vista do vivente" ou tu é feio pra caralho! Ou seja, tu é um merda até em termos de adjetivos!"

Dito isso, informo que se alguém quiser fazer sucesso (mas sucesso do tipo estourar nas rádios, e não tocar pra 15 pessoas no salão da igreja do teu bairro), favor falar comigo. Esta canção que transcrevo agora saiu como single na Finlândia e já estreou em 2º lugar nas paradas geladas daquele país tão branco. Lá vai:

A arte perdida

Um milhão de anos e a tumba intacta
Cem mil anos e a nação não desconfiava de nada
Segredos de pai pra filho
Segredos que eram mantidos
Quando aconteceu apenas um ficou sabendo
E contou pra alguém com a lealdade de um cão
Segredos não existem mais
Segredos, baita ilusão

Confiança que um dia houve
Será que alguém ainda acredita?
“Não confie nem na sua sombra”
Segredo é a grande arte perdida

A era da informação, a comunicação por segundo
De que adianta velocidade
Se nos escondemos do mundo?

Venha rápido, todos querem saber
Saber o que todos fazem a cada momento de todas as vidas
E se eu não quiser, se eu te contar e te pedir
Tu ainda lembra o que fazer?

Confiança que um dia houve
Será que alguém ainda acredita?
“Não confie nem na sua sombra”
Segredo é a grande arte perdida

Hajime Saitou, 2005.


É no fundo do poço que mora o estilo

Wednesday, May 16, 2007

Airbag

Exatamente daqui um mês, dez anos atrás, era lançado OK COMPUTER, do Radiohead. Em 16 de junho de 1997 Thom Yorke e comparsas lançaram uma obra que ao retratar o momento crucial da virada do milênio, da substituição da máquina pelo humano, da tecnologia em detrimento de qualquer outra coisa que pudesse ser desenvolvida, tornou-se atemporal – como um Dark Side of the Moon da era Internet - Digital - Yuppies - Mega Corporações controlando a rotina do ser humano.
O choque de constatar que as palavras e principalmente o clima etéreo e claustrofóbico (de deixar o ouvinte angustiado de verdade) do disco previram os dias de hoje (e os que virão), é o mesmo de ouvir em 97 um cara que teve uma visão tão clara do futuro, por assim dizer. E o futuro, como sabemos, não é bonitinho, florido e “pra cima”. O futuro é cinza, intimidador e desenvolvido em códigos binários invisíveis. Quando não em Esperanto ou mensagens codificadas, para que sejam difundidas sem interferências (George Orwell, emissões subterrâneas, teorias conspiratórias, etc.).
E o disco é um negócio pesado - no sentindo de denso mesmo -, de difícil digestão e mesma compreensão. Não é música para ouvir no verão ou “para curtir”. É música urgente mesmo dez anos depois da primeira vez que foi ouvida.
O som continua impressionando pela "complexa simplicidade" ao utilizar-se de tantos recursos - vejam só! – tecnológicos sem soar datado. Disco para entender como chegamos até aqui e para descobrir que o lugar para qual estamos indo é culpa exclusivamente nossa, e não das máquinas ou dos sistemas que desenvolvemos.
Fragmentos do Caos:

"When I'm king, you will be first against the wall" - Paranoid Android

"This is what you get, when you mess with us" - Karma Police

"You look so tired and unhappy/ Bring down the government/ They don't, they don't speak for us/ I'll take a quiet life/ A handshake of carbon monoxide" - No Surprises

Monday, May 14, 2007

Eterna Mudança


Algumas músicas mudam o jeito de uma pessoa pensar. Alguns discos mudam o mundo, ou abrem milhões de mentes ao mesmo tempo, ou levam muito tempo para serem compreendidos. Outros nunca são.
Quando eu passei dos dez anos de idade um enigma caiu em minhas mãos, e à medida que ele adentrava meus ouvidos, a curiosidade aumentava gradativamente. O quebra-cabeça auditivo era a trilha sonora do documentário IMAGINE, que em 21 faixas tenta traçar a trajetória de John Winston Lennon pela música, pela Terra, pela vida. Lógico que não consegue, pois condensar quem foi esse cara (que foi tudo até chegar ao ponto de ser ele mesmo) em 21 músicas ou em duas horas de projeção é como tentar explicar em 3 minutos o que as pessoas realmente querem. Coisa que ele conseguiu fazer diversas vezes!
Após o interesse inicial (e de tornar-me fã dos Beatles algum tempo depois de ouvir o álbum), não ouvia com tanta freqüência aquela trilha sonora especificamente, assim como tantos discos que entraram e saíram da minha audição mais assídua. Porém sempre que eu retornava ao disco, descobria algo novo. Um significado, uma letra que representava algo antes incompreensível, uma ironia, enfim, era como se ao descobrir um pouco mais sobre a obra daquele homem que nas fotos do encarte aparece em diversos momentos da sua vida, porém sempre com o mesmo olhar, eu começava a entender coisas das quais não me dava conta vivendo sozinho em meus pensamentos. Ali encontrava eco para muitas idéias, ali havia alguém dizendo coisas relevantes, mesmo que tão distante no tempo e no espaço. Naquele CD de capa branca a vida pulsa, para quem ainda quer entendê-la um pouco mais, ou perder-se de vez.
Real Love abre o disco numa versão acústica e praticamente caseira de Lennon (diferente daquela produzida pelos outros três besouros restantes no Anthology). Uma música singela, com direito a um dos artifícios mais prosaicos da música pop (refrão assoviado), a princípio não chama a atenção de ninguém. O problema é que John te deixa desprevenido conscientemente. Só depois de conhecer muito bem o trabalho e o pensamento do cara é que uma obra de arte como essa faz todo o sentido.

Do começo melancólico e esperançoso que remete aos Beatles, (All the little girls and boys/ Playing with their little toys/ All they really needed from you/ Is maybe some Love), Passando pela constatação de que o mundo realmente não é como a gente gostaria que ele fosse, (All the little boys and girls/ Living in this crazy world/ All they really needed from you/ Is maybe some Love/ Why must we be alone?/ Why must we be alone?/ Well it's real life/ Yes it's real) E finalmente chegando ao fim sabendo que mesmo que as coisas não mudem por completo, se isso é a minha verdade, então a vida pode fazer um pouco de sentido.
(I don't expect you to understand/ The Kingdom of Heaven is in your hands/ I don't expect you to wake from your dream/ too late for crying now, it seems/ All your little plans and schemes/ Nothing but a bunch of dreams/ All you really needed to do/ Is maybe some love).

Ali, logo de cara, está uma síntese do pensamento de John. Mas não é só isso, obviamente. O Track List passeia por praticamente todas as fases do músico, começando com Twist and Shout, Help! e In My Life da fase “inocente” dos Beatles, Strawberry Fields Forever, A Day in the Life e Revolution da fase “psicodélica” e Ballad of John and Yoko, Julia e Don’t Let me Down do crepúsculo “amadurecido” da maior banda de todos os tempos. Esta primeira metade do álbum também poderia chamar-se Aula de Música que ninguém ousaria discordar.
A partir daí o disco cobre a fase solo de Lennon (com ou sem a Plastic Ono Band). Mother e How?, Jealous Guy e Beautiful Boy, Woman e (Just Like) Starting Over... São tantas coisas a dizer de cada uma delas, tantos significados... Mas a que mais impressiona é God. O cara simplesmente anteviu o espírito das décadas seguintes: descrença (no futuro, na humanidade, enfim...), individualismo beirando a loucura, cinismo, inteligência irônica, não levar-se a sério... Geração X, vocês foram detectados 20 anos antes de existirem! Mas pelo menos o Kurt sabia.


God – John Lennon

God is a concept
By which we measure
Our pain
I'll say it again
God is a concept
By which we measure
Our pain

I don't believe in magic
I don't believe in I-ching
I don't believe in Bible
I don't believe in tarot
I don't believe in Hitler
I don't believe in Jesus
I don't believe in Kennedy
I don't believe in Buddha
I don't believe in Mantra
I don't believe in Gita
I don't believe in Yoga
I don't believe in kings
I don't believe in Elvis
I don't believe in Zimmerman
I don't believe in Beatles

I just believe in me
Yoko and me
And that's reality
The dream is over
What can I say?
The dream is over
Yesterday

I was the Dreamweaver
But now I'm reborn
I was the Walrus
But now I'm John
And so dear friends
You'll just have to carry on
The dream is over

Genial. E cada vez que o CD de capa branca sai da minha coleção para ser lido pelo aparelho de som, algo acontece. Isso é música.