Monday, May 29, 2006

87 Minutos - Good Night and Good Luck


Neste espaço de tempo foi sintetizada a idéia que tentei passar com o que escrevi nesse naco de internet até o momento: traçar uma linha estranha acerca dos movimentos humanos no já famigerado período “pós-11 de setembro”. Confusão, desconfiança, arrogância, prepotência, retaliação, individualismo exacerbado, terror... E medo.
Achei que agora falaria sobre o filme Crash – No Limite, no qual um roteiro urgente e desconfortavelmente atual, além de muito bem arquitetado na escola “Robert Altman de cinema”, se perde em uma maneira de dirigir estranha e preguiçosa.
E aí George Clooney acaba com qualquer pensamento que eu supostamente teria condições de articular. Ele volta na história cinqüenta anos, no auge da “caça às bruxas” e do Macarthismo, para retratar de maneira cáustica e romântica (por mais estranho que possa parecer nunca um roteiro inteligente e uma fotografia saudosista casaram tão bem) o que os Estados Unidos (e por conseqüência o Ocidente, vide os golpes militares na América do Sul) estavam passando. E tudo isso soa tão bizarramente atual. E é nesse ponto que reside o trunfo do filme e mais que isso, do roteiro: jogar luz no passado para que vejamos que estamos insistindo no mesmo erro.
Ao retratar a jornada de personagens tão pontuais para a história - irônica e tristemente também tão atuais - com tanta maestria, Clooney encerra a questão com uma interrogação grande o suficiente para atiçar a mente dos que ainda refletem sobre algo nesse planeta desvairado.
Mídia, jornalismo, televisão, política, poder, ego, guerra velada, coragem, liberdades individuais, engajamento, lucidez, terrorismo psicológico, e acima de tudo, CINEMA. Uma hora e vinte e sete minutos que retratam um passado que não devemos esquecer, para que no presente e no futuro os mesmo fatos não se repitam.
Penso que desejando que cada um olhasse e prestasse atenção em cada detalhe deste filme, faço o mínimo e encerro por aqui minha participação.
Obrigado Clooney, Strathairn e Edward R. Murrow.
Boa noite, e boa sorte.

“... We will not walk in fear, one of another. We will not be drivenby fear into an age of unreason, if we dig deep in our history and our doctrine, and remember that we are not descended from fearful men – not from men who feared to write, to speak, to associate and to defend causes that were, for the moment, unpopular”.

- Edward R. Murrow

Friday, May 26, 2006

Sono Induzido

- Amor, tenho que te dizer um negócio.
- AMOR?
- Tu também quer dizer alguma coisa amor?
- Quando tu vai parar de me chamar assim? Tá, a gente é amigo há um tempão, eu gosto de ti e teve aquela vez e tal (Denise se odiava por isso), mas essa tua fantasia tá indo longe demais Ricardo!
- Não quero discutir isso mais uma vez Dê. (Ele sabia que Denise odiava quando a chamavam daquele jeito. Estava querendo irritar sua “namorada”). Eu tenho que te contar um negócio!Pelo tom empregado por Ricardo, Denise já sabe que nada no mundo o fará ficar quieto ou mudar de assunto, então apanha uma revista da semana e começa ler pela parte traseira da mesma.
- É o seguinte: não consigo mais acordar! Toda manhã é a mesma coisa, eu me esforço pra sair do estado letárgico, mas minha mente e meu corpo, ao que tudo indica, fizeram um pacto para me manter enfiado na cama por horas intermináveis!
Ricardo balança as mãos, escora a cabeça nelas, levanta e senta várias vezes, com o ar de quem revelou o maior escândalo da humanidade até aquela tarde de quinta-feira. E Denise segue impassível lendo a mais nova picuinha arranjada por um “jornalista-articulista”, como ela gostava de dizer em voz alta para os amigos da faculdade.
- Tu ta dizendo que tem insônia ao contrário?
- Exatamente isso que eu pensei! – exulta Ricardo. O brilho nos olhos dele ao ver que ela sabia do que ele estava falando passavam uma carga de loucura que ninguém notava. E Denise ignorava solenemente.
- Mas aí eu formulei outra teoria para a causa do meu “não-acordar”: eu não quero mais viver! É tão simples e há tantos anos que eu sinto isso sem sentir que chega a ser engraçado.
Aquele sorriso, seguido de um som tão auto-complacente como aquele, denotava o que ela já desconfiava. Ele não havia enlouquecido, mas depois de todas as coisas que teve de enfrentar nos últimos três anos e meio, estava tentando se convencer de que teria que se matar. Aquela história de não acordar era só uma maneira de criar coragem. Sua mente e ele não se entendiam mais, e esse era o último lugar que fazia sentido para “o velho Ricka”. Denise não sabia que palavras usar. E foi o que fez, não usou nenhuma.
- Então tá Dê, só passei pra te dizer isso. Sinto tanta dificuldade em acordar e de me manter desaperto durante as horas... Como eu nunca percebi que esse era o sinal que eu estava mandando pra eu mesmo sobre continuar tentando fazer aquilo que não sou capaz de fazer a tanto tempo (“quantos dias cabem em três anos e meio”, pensou ele), ou seja, continuar vivendo!
Mais uma vez as mãos desabam pelo ar e pela cabeça dele. E então com uma serenidade que surge de algum lugar da Ásia, Ricardo beija a testa de Denise e deixa a casa. E ela vai levar 17 minutos para esquecer a conversa daquela tarde.

Wednesday, May 24, 2006

A Vila


Qual é a fonte de nossos medos? O sentimento de temor já estava instalado em nossas mentes e de repente algo o acende, ou “sentir medo” é uma reação automática a um estímulo específico?
Isso pouco importa quando o assunto é cinema. Ninguém se pergunta por que leva um cagaço quando o assassino salta por trás da porta, com a faca afiada apontada pro pescoço da moçinha. Mas dependendo da habilidade do diretor, todo mundo dá um salto da cadeira.
A Vila vai muito além do susto. Aliás, susto mesmo há em três, quatro cenas, e olhe lá. O filme abre mão deste artifício simplesmente porque se propõe a traçar um plano muito mais profundo do que assustar. A “alegoria” que o filme sugere gira quase que cem por cento nas várias formas de medo que a sociedade enfrenta há séculos. Mesmo que isso seja feito através de metáforas que muitas vezes passam despercebidas do grande público, que espera “o cara apavorante perseguindo adolescentes indefesos numa noite de lua cheia”.
A primeira cena é de um funeral onde um homem se debruça por cima de um caixão branco e pequeno o suficiente para ser de uma criança, e se pergunta por que aquilo está acontecendo, de uma maneira um tanto mais lacônica do que desesperada. Tratando-se de M. Night Shyamalan a primeira cena diz muito sobre a trama do filme, mas isso tu só vais descobrir lá na última meia hora. Nos próximos dias o diretor indiano será alvo de reflexão aqui no Coffee.
A película vai se desenrolando e o roteiro e a maneira como ele é desenvolvido é tão hábil, que além de conseguir passar a sensação de desconforto e de que “algo não encaixa”, o espectador sente o medo de estar sendo enganado! E isso para um filme com a temática proposta por Shyamalan é um trunfo descomunal.
Pontuando todo o longa existem questionamentos específicos sobre como agem as pessoas quando confrontam situações que imputam medo sobre elas: amar com todas as forças uma pessoa, mas guardar o sentimento em função do medo da rejeição; não arriscar a liberdade por medo do desconhecido (floresta, “aqueles de quem não falamos...”); proteger aqueles que mais amamos de maneira possessiva, por causa do medo de perde-los de maneira abrupta e estúpida (ou o medo de que isso se repita). Assim como questões mais sutis, que entregariam muito da trama.
No balanço final, A Vila é muito mais do que um simples filme. As pessoas deveriam analisá-lo sobre tantos ângulos, tantas teorias e correntes de pensamento que fica difícil entender o bombardeiro que o longa sofreu por parte massiva da crítica e do público. Talvez seja pelo fato de ver seus temores sendo analisados e expostos na tela.

"A única coisa de que devemos ter medo é do próprio medo" - Franklin Roosevelt

Monday, May 22, 2006

One of many zeros


Damon Albarn estava com o coração em pedaços. Estava todo em pedaços. Atravessava um processo de separação com a namorada. E dessa situação, mais uma vez como já aconteceu incontáveis vezes na história da música, nasceram pelo menos duas canções antológicas. Uma é Tender, que abre o álbum 13. Música Gospel feita por ingleses universitários, com uma das interpretações mais comoventes dos anos 90. Na letra Damon já deixava claro pelo que estava passando no momento: “Tender is the night/ Lying by your side/ Tender is the touch/ Of someone that you love too much/ Tender is the day/ The demons go away/ Lord I need to find/ Someone who can heal my mind” (Doce é a noite/ Ficando do teu lado/ Doce é o toque/ De alguém que tu ama muitíssimo/ Doce é o dia/ Os demônios desaparecem/ Senhor eu preciso achar/ Alguém que possa curar minha mente). Outro dia Tender será totalmente dissecada, mas por enquanto um verso dá a plena dimensão do que Damon queria dizer: “ Tender is my heart/ I’m screwing up my life” (Doce é meu coração/ Eu estou ferrando com a minha vida). Bom, o lance é que nesse disco consta a música que empresta o nome para este espaço que ainda não sabe direito o que vai ser quando virar o mês, Coffee and TV. Falar dessa música é tão inútil quanto descrever o quanto a guria que tu ama é linda. E mesmo para os incautos que devem taxá-la de “música pop alegrinha e de quinta”, Graham Coxon faz um solo demolidor, com uma distorção que estranhamente remete o narrador da história à realidade. É como se a guitarra de Coxon dissesse para Albarn “esquece cara, ela é passado”. Estranhamente foda. E o clipe é uma obra também.
Aí vai a letra, devida e livremente traduzida.
Café e TV
Você se sente como uma loja de cadeia
Praticamente pavimentado
Um em muitos zeros
Chutado e entediado
Suas orelhas estão cheias mas você está vazio
Oferecendo seu coração
Pra pessoas que realmente nunca
Se preocupam como você está
refrão:
Então me dê café e tv, tão simples
Eu vi tanto, eu vou ficar cego
E eu estou virtualmente e clinicamente morto
Estar na sociedade é bem difícil pra mim
Me leve para longe desse mundo grande e mal
E concorde em casar comigo
Então nós poderemos começar de novo
Você vai para o interior
E não é muito longe
Há pessoas lá que irão te machucar
Pelo que você é
Suas orelhas estão cheias da linguagem deles
Há sabedoria lá, você está certo disso
Até que as palavras começarem a te desprezar
E você não poder achar a porta

Friday, May 19, 2006

Ás de Copas

Monólogos do Inconsciente – Capítulo I

- Sei lá, 15, 16 anos que a gente se conhece. Acho que três caras que se conhecem e convivem tanto tempo juntos, de uma maneira ou de outra podem ser considerados amigos. Lembra daquela vez no colégio que a gente ia ser expulso e a gente contou a mesma mentira, sem saber o que o outro ia dizer?
Thomas sempre falou demais, e falava coisas interessantes em momentos nada oportunos. Ou falar de amizade e irmandade quando se está devendo 20 mil e uns quebrados em dívidas de jogo e outras coisas mais para um traficante-assassino, com uma soma de dinheiro de R$ 276,00 somando o que os três tem, e o pagamento é pra HOJE, é oportuno?
- Velho, sinceramente, eu acho que as coisas boas e ruins que aconteceram nas nossas vidas foram por causa da nossa amizade. E eu não mudaria nem uma linha, nada, mesmo se a gente for morrer hoje. Concorda George?
Thomas e Ricardo riem com o canto da boca. Sabem que “George” (na verdade meu nome é Luciano) não vai responder nada. Pois eu não sou o que pode se chamar de cara falante. Não falo por motivos que não vem ao caso, mas pensando agora na metáfora e no clichê que nós três nos transformamos, a minha mudez se encaixa perfeitamente:
Thomas é o líder, o que tem as idéias, o cara que não para de falar e que das duas uma, ou põem tudo a perder ou dá o golpe do século. Naturalmente tomou o posto de cabeça do trio, sem esforços ou imposições. E o principal, além de inteligente Thomas era um grande canalha com um senso de humor extremamente estranho. Seu apelido: John.
Ricardo era o contraponto a Thomas, mas apenas no campo das idéias e opiniões, porque os dois sempre foram como unha e carne, desde sempre. E Ricardo respondia pela parte lógica, prática do nosso negócio. Não dávamos um golpe ou cogitávamos uma idéia se Ricardo dizia que era impossível. Nós o chamávamos de Paul.

E eu não falo. Sou o cara da execução, o que faz a parte suja do nosso negócio.

- Mas é sério. Eu acho que se nós não fossemos golpistas, assaltantes, jogadores canalhas “parias da sociedade”, nós seríamos alguma coisa juntos, entende? Sei lá, funcionários da mesma empresa, algo do tipo. Não é destino, acho que é alguma coisa inconsciente, que não tem muito a ver com o que a gente pensa, mas sim com o que a gente é na real.
- Não exagera Thomas. Que mania desgraçada que tu tem de exagerar as coisas! O negócio agora é o seguinte: COMO sair dessa situação? Ou vocês querem esperar os homens do Pé aqui nesse lugar, falando sobre como seria legal se pudéssemos continuar vivos?
- Não viaja velho. A gente tá fudido, não tem mais jeito. É muita grana pra muito pouco tempo.
- Pouco tempo é o cacete. Seguinte: Thomas vai falar com o teu primo...Ah velho, nem faz essa cara, ele nos deve metade da grana que a gente precisa! Faz ele pegar, não me interessa como! Eu vou falar com a Bianca, vai que ela tenha alguma coisa escondida ainda. Na volta vou tentar pelo menos uma mão no Bar do Gordo. George, tu sabe o que tu tem que fazer né?
Eu só aceno com a cabeça que sim. Thomas tá atordoado demais pra questionar o que o Ricardo tava dizendo, embora os três saibam que ninguém concorda com o que a gente ta fazendo. Mas agora virou questão de sobrevivência, e pela primeira vez, “Os Perdidos” vão atuar sozinhos e sem saber o que o outro vai realmente fazer para conseguir a grana. E o apelido “Pé” vai ser justificado.
Fim do Capítulo I
15/01/2005

Thursday, May 18, 2006

Os Anedotistas


Jack White e Brendan Benson vão lançar um disco juntos! Como tantos boatos surgidos na Internet, esse parecia ser um daqueles tantos que gostaríamos que fosse verdade. Isso deve ter surgido lá por setembro do ano passado. White e Benson são de Detroit e se tornaram amigos no final da década de 90. Brendan já batalhava no underground há algum tempo, enquanto Jack começava a dar os primeiros passos com sua banda nada convencional.
Meia década depois, Jack tem o nome de sua banda consolidado pelas principais publicações de rock do mundo, e preparava um disco com um single pronto para alcançar o primeiro lugar. Brendan lança um disco sem grande alarde, mas que o ajuda a agregar uma base de fãs fervorosos.
E se no começo da carreira era Brendan quem “ajudava” Jack, agora era Jack quem dava uma “força” para o comparsa: em um show da turnê dos White Stripes, Benson toca apenas músicas de White, e o amigo retribui o show invertido.
Após mais alguns anos de amizade e cumplicidade musical, em maio de 2006 (já?), é lançado Broken Boy Soldier, disco dos The Raconteurs. Jack Lawrence e Patrick Keller da banda The Greenhornes são a cozinha, enquanto que Jack White e Brendan Benson tornam os sonhos dos fãs de música realidade: tocam guitarra, compõem, cantam um as músicas do outro. Enfim, fazem o que faziam separados, que já era ótimo, só que somando os esforços. Por enquanto Steady, as she goes, uma das duas canções disponíveis na Internet (a outra é Store Bought Bones) une o melhor dos dois mundos: guitarra estridente diretamente de Elephant e letra e refrão trabalhados com esmero pelo criador de Lapalco. E que a esforçada Sum Records tenha a bondade de trazer ao nosso País de PCC, futebol e carnaval esse momento histórico.

Cenas dos próximos capítulos: White Blood Cells, do The White Stripes; The Alternative to Love, do Brendan Benson; e o próprio Broken Boy Soldier supracitado.

* Foto retirada do bom
www.whitestripes.com.br/raconteurs/
www.theraconteurs.com
www.sumrecords.com.br/

Tuesday, May 16, 2006

1,60m (ou menos) de talento


Jenny Lewis nasceu em Las Vegas e criança já inclinava-se às artes, sendo atriz desde a infância. Anos mais tarde fundou a banda alternativa Rilo Kiley ao lado do guitarrista Blake Sennet em 99. Após três discos muito festejados pela crítica, Jenny, incentivada pelo amigo Conor Oberst (a.k.a. Bright Eyes), começa a trabalhar em um álbum solo, com composições de vários períodos de sua vida e material novo. O projeto é dividido com as irmãs Chandra Watson e Leigh Watson, as Watson Twins.
Indie, Pop Alternativo, Country, Alt. Country. Rótulos que nem de longe definem um disco como Rabbit Fur Coat (2006). Vá lá, no disco praticamente todos os estilos citados anteriormente constam, mas e daí? Pra que falar de rótulos, estilos, modismos e o caralho, quando a canção sobrepõe tudo isso? Das onze músicas, pelo menos quatro são muito, mas muito acima da média. E as outras só são ótimas mesmo...
O disco abre com Run Devil Run, canção que prioriza a harmonia das três vozes envolvidas no disco. A música serve de vinheta para a canção mais poderosa e candidata a música da década: Big Guns. Violões em profusão. Voz que lembra veludo vermelho. Backing vocals tão afinados que chegam a assustar. Palmas, mais violões, uma letra doída e bonita. Dois minutos e trinta e quatro segundos depois não tem mais volta, Jenny Lewis já te desarmou. O que se segue após Big Guns não fica abaixo, mas a força da canção é tanta que o registro dela na memória perpassa toda audição do disco. “First I'll build a sword/ Get some words to explain/ It's a plan, brother, at least/ And I'll pretend that everybody here wants peace/ Have mercy, have mercy, have mercy on me/ Cause we're tired and lonely and we're bloody...”. Cantora, compositora e música de mão cheia (além de ser bonita!), Jenny desfila suas composições com teor clássico do cancioneiro americano, mas com um toque de leveza que só mulheres emprestam para as canções.
No decorrer do disco, músicas como Happy, um bluegrass perfeito; The Sharging Sky, onde ela mostra que pode ser tudo o que Ryan Adams anda devendo nos últimos dois anos; Rabbit Fur Coat, que relata uma história barra pesada de maneira sóbria, porém sacana, como se Johnny Cash ouvesse lhe dado algumas aulas antes de acertar as contas na encruzilhada; e Handle With Care, música com a colaboração de Ben Gibbard do Death Cab for Cutie e que é de ninguém mais ninguém menos do que dos Travelling Willburys, demonstram o quanto está amadurecido este talento, de que agora é só esperar novos discos de Miss Jenny.
Quando a vi na televisão com sua banda e as gêmeas Watson, tocando Big Guns, sabia que se tratava de uma compositora especial. Não sabia que com um disco apenas faria tanto estrago, e tantos sons memoráveis. Talvez apenas o My Morning Jacket tenha me espantando com apenas um LP...
E sim, o disco é bem Alt. Country!

Monday, May 15, 2006

My Father's gun


O que falar sobre um filme de Cameron Crowe? E ainda mais um filme com tantas características peculiares de seu cineasta, que remete a quase todos os temas tratados em suas películas anteriores? Falar da fotografia sóbria que ganha contornos singulares pela maneira como explora as impressionantemente familiares paisagens do meio-oeste americano seria chavão demais. Dizer que o Drew Bailor de olhar vazio criado por Orlando Bloom nada mais é do que o retrato do próprio Cameron em um dos mais difíceis períodos de sua vida seria correto, porém incompleto. Explorar o relacionamento quase que surreal e perfeito demais para ser verdade (como seria bom...) de Drew com Claire Colburn, uma aeromoça que é o elo perdido entra as “Blondies California Dreamin’ Girls” e a doçura e esperteza brejeira das “Mid-West Girls”, bem, até que seria legal, mas a verdadeira relação que carrega o filme da abertura dos créditos com música alternativa até o último frame é a do filho com o pai.
Drew vai cometer o suicídio mais hilário da história quando é interrompido pela notícia de que o pai morreu no meio de uma visita aos parentes no velho Kentucky, e como primogênito, está encarregado de tomar conta do funeral. Aliás, Drew vai se matar após causar um rombo bilionário (arredondando) para sua empresa, mas nota-se que por dentro o que o incomodava era desapontar o seu chefe, que nos anos que dedicou a empresa fazia as vezes de figura paterna.
Dedicar oito anos para alguma coisa, fracassar retumbantemente, desapontar uma pessoa pela qual tu tens respeito e admiração, e receber a notícia de que a relação há muito perdida com o teu pai ficará realmente perdida para sempre. Alguns chamam isso de um dia ruim. Para Drew, foi o recomeço de tudo.
Se existisse uma escala para pessoas espertas no meio artístico, seria a Escala Crowe. A maneira como ele dispõe os roteiros para que eles escondam a real intenção de seu filme é algo realmente muito bala. Para o espectador desavisado o relacionamento de Drew com Claire é a verdadeira redenção do personagem-persona. Porém para quem conhece a obra e o autor, sabe que a verdadeira conquista pessoal de Drew “Crowe” é a aproximação, ainda que aparentemente tardia, com seu velho pai. Desde os últimos contatos que a memória consegue alcançar, como as brincadeiras da infância, até a falta de jeito com o pai morto, e culminando no enterro preparado como uma viagem ao fundo do sentimento mais estranho, mais forte e tantas vezes tão difícil de demonstrar por pai e filho. E a cena do pó sendo lentamente levado pelo vento no carro é para destruir quem entende o que se passa com Drew.
E eu nem falei da trilha! Tom Petty, Ryan Adams, My Morning Jacket...se houver um outro dia eu falo.

Friday, May 12, 2006

Profundidade Escondida

Existe tarefa mais simples do que desancar os Estados Unidos da América? Qualquer intelectualóide que curse faculdade vai listar 500 motivos, se ele não gostar muito de se alongar, do porque devemos odiar do fundo dos nossos corações tropicais qualquer coisa que venha daquele território. Tenho que dizer que não nutro nenhuma espécie de simpatia pelo american way of life, e pra ser sincero 90% do que é americano consiste em coisas ruins para essa bobagem que se chama resto da humanidade. E é aqui que o caminho se bifurca: quando tu constata que algo em que tu acreditava, ou compartilhava, se deteriora inadvertidamente, as tuas opções são a) partir para a ignorância (Michael Moore faz isso muito bem) ou b) voltar-se para o que um dia fez daquilo que tu acreditava algo grande, bonito e simples.
Jenny Lewis parece demonstrar ao ouvinte de suas canções que se o povo não lembrar de onde ele veio talvez nunca se livre dos que usam suas memórias contra eles. E ela faz isso sem canções de protesto, embora utilize o folk, mas sim com melodias que cortam os ouvidos yankees, com melodias rurais e empoeiradas que remetem não a um tempo específico, mas a um estado de espírito que se perde conforme um povo passa a utilizar sua história como muleta, e não como veículo para aprimoramento.
Cameron Crowe vai além de Jenny. Utilizando a música americana (ou que trate do país) como um complemento artístico e afetivo aos seus filmes, pinta um quadro de um país em que os filhos não conseguem entender o mundo em que os pais viveram, pois cada 30 anos que se passa em solo americano parecem distanciar mais o que eles foram e o que eles estão prestes a se tornar. E faz isso com filmes de linguagem e temáticas simples, mas que são muito mais do que aparentam ser.
Nos próximos dias textos sobre o disco de Jenny Lewis com as Watson Twins – Rabbit Fur Coat – e do último filme de Cameron Crowe, Elizabethtown. E por mais incrível que possa parecer, essas linhas mal escritas não usaram em nenhum momento a expressão FUCK YOU BUSH! Logicamente ele merece, mas saibamos separar coisas separáveis, como Mensalão e Brasileirão 2006.

Thursday, May 11, 2006

No início era o começo...

Junte todos os livros, discos, filmes, referências, todas as coisas que se enquadram em cultura que tu conhece e gosta. Quanto disso é o que tu realmente és? Sempre entendi que as coisas que tu sabe formam quem tu realmente é, mas será que se eu não soubesse quem são George Harrison, Kurt Cobain, Damon Gough, Kevin Smith...e as coisas que fizeram, eu pensaria de outro jeito? Creio que sim, e se pensasse diferente, provavelmente agiria diferentemente. Então a cultura é algo que pode mudar as pessoas? Lógico, e com este ínfimo espaço, talvez alguém mude e é disso que se trata a nossa existência, mudar.
No início era o começo. Depois disso nada mais foi como era antes.